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Por: Ozlem Dikme.

Tradução por: Laisla Cristina de Souza. 

Apresentação de Caso

Um homem de 22 anos, previamente saudável, foi levado ao pronto-socorro (PS) com dor abdominal iniciada recentemente. Ele não havia comido nada desde aquela manhã devido à perda de apetite. Ele teve náuseas e vomitou três vezes. Sua dor abdominal começou em torno da área umbilical e epigástrica. Sua dor aumentou à medida que se movia em direção ao quadrante inferior direito (QID). A dor máxima foi sentida na fossa ilíaca direita. Ele não havia tomado nenhum medicamento. Sua história social revelou que ele não era etilista, não fumava e não usava drogas ilícitas. Sua dieta consistia principalmente de carboidratos. As histórias passadas e familiares não eram dignas de nota. Sua pressão arterial era de 120×70 mmHg, a frequência de pulso era de 100 bpm, a temperatura era de 37,8 ° C (100 ° F) e a frequência respiratória era de 22 ipm. O exame físico mostrou ruídos hidroaéreos normais (O áudio está disponível aqui), sensibilidade e proteção voluntária, particularmente sobre a fossa ilíaca direita. Os ângulos costovertebrais não eram tenros. A ingestão oral foi interrompida, o cateter intravenoso (IV) foi inserido, os exames de sangue e urina foram providenciados e a fluidoterapia foi iniciada. A urinálise foi normal. Contagem de leucócitos foi de 14.500 com 89% de linfócitos polimórficos e 11% de linfócitos. A ultrassonografia (USG) mostrou uma estrutura tubular não compressível de 9 mm de diâmetro no quadrante inferior direito (QID). Ele foi admitido na enfermaria cirúrgica com o diagnóstico de apendicite aguda. Você pode descrever a descoberta no ultrassom fornecido neste vídeo?

Introdução

Cerca de 7% da população desenvolve apendicite em suas vidas. Os homens são afetados 1,4 vezes mais que as mulheres, e adolescentes mais que adultos (3: 2). A incidência aumenta gradualmente desde o nascimento, tem pico no final da adolescência, e declina na velhice. Ocorre em todas as faixas etárias, mas mais frequentemente entre os 10 e 30 anos de idade. A prevalência é maior em países com hábitos alimentares de baixa fibra e muitos carboidratos refinados. Fibra dietética baixa causa formação fecal e obstrução da luz apendicular.

Ações críticas beira-leito e Abordagem geral

A abordagem geral para um paciente com possível apendicite aguda deve começar com a estabilização do paciente. Felizmente, a maioria dos pacientes vem com apresentação clínica estável exceto dor. Alguns pacientes podem-se apresentar tardiamente. Nesta situação perfuração é uma possibilidade. Assim sendo infecção abdominal difusa, infecção sistêmica, mesmo sepse / choque séptico podem ser outra prioridade para o médico. Depois segue-se a avaliação ABC orientada para sistema gastrointestinal e pélvico. Dependendo das necessidades do paciente, ações críticas necessárias na Avaliação ABC inicial podem ser aplicadas. Contudo, implantação de cateteres IV e início de fluidoterapia são a prioridade na maioria dos casos. A ingestão oral deve ser interrompida. Medicações para dor e administração de antibióticos podem ser considerados na fase inicial dependendo da situação do paciente. 

A possibilidade de apendicite aguda deve ser explicada, e a aprovação do paciente deve ser obtida para etapas posteriores. A avaliação deve incluir testes laboratoriais e exame de imagem. Contagem de células sanguíneas e proteína c-reativa (PCR) geralmente não são específicos para diagnosticar, mas podem ser úteis para confirmar ou excluir diagnósticos diferenciais. USG ou tomografia computado são modalidades de exame de imagem possíveis.

Dicas de História Clínica e Exame Físico

A dor abdominal é a queixa mais comum. Normalmente começa periumbilical ou epigástrica, em seguida, migra para o QID. Essa é a característica mais discriminante da história do paciente. Sua sensibilidade e especificidade são aproximadamente 80%; a razão de verossimilhança positiva é de 3,18, a razão de verossimilhança negativa é 0,5. Pacientes normalmente evitam se mover porque piora sua dor. A história clássica de anorexia, dor periumbilical seguida de náuseas, dor no QID e vômitos ocorrem apenas em 50% dos casos. Náusea está presente em 61-92% dos pacientes, anorexia em 74-78%. O vômito quase sempre segue a dor. Diarreia ou constipação é notada em 18% dos pacientes. Em até 50% de casos, sensibilidade local ponto de Mc Burney e rebote pode ser presente. Achados físicos típicos são dor à descompressão brusca, dor à percussão, defesa abdominal e rigidez. A sensibilidade em QID é observada em 96% dos pacientes, mas é inespecífico. Outros sinais de irritação peritoneal são dor no QID durante à palpação do quadrante inferior esquerdo (sinal de Rovsing), com rotação interna e rotação externa do quadril direito flexionado (Sinal Obturador), com a extensão do quadril direito (sinal de Psoas), com tosse (Sinal de Dunphy) ou com queda de de pé nos dedos dos pés (Sinal de Markle).

Diagnósticos Diferenciais

Muitas doenças específicas diferentes causam dor abdominal. A lista abaixo é dada em ordem alfabética. Nós aconselhamos que procure por capítulos específicos de outras entidades de doença específica para entender as diferenças de apresentação, diagnóstico e tratamento.

  • Colecistite Aguda Ou Cólica Biliar
  • Gastrite Aguda ou Doença da Úlcera Péptica
  • Carcinoma Colônico
  • Diverticulite
  • Gastroenterite
  • Doença Inflamatória Intestinal (Doença de Crohn, Colite Ulcerativa)
  • Hérnia inguinal
  • Intussuscepção
  • Divertículo de Meckel
  • Adenite Mesentérica
  • Isquemia mesentérica
  • Torção Omental
  • Pancreatite
  • Perfuração visceral
  • Hematoma da bainha do reto
  • Patologias tubo-ováricas (Gravidez Ectópica, Doença Inflamatória Pélvica, Abscesso, Endometriose, Cisto/ Torção Ovarianos, Leiomioma Uterino)
  • Febre tifóide
  • Ureterolitíase ou Infecção do Trato Urinário

Testes Diagnósticos de Emergência e Interpretação

Apendicite é um diagnóstico clínico. No entanto, alguns testes laboratoriais podem ajudar médicos de emergência no processo de tomada de decisão. Cada teste tem alguns prós e contras. Portanto, sua história clínica e exame deve ser a parte principal do seu processo de tomada de decisão. Depender de testes de laboratório podem enganá-lo em alguns casos.

O Hemograma é um teste facilmente acessível e barato, mas não é específico. Estudos mostram consistentemente que a contagem de leucócitos é maior que 10500 / mm3 em 80-85% dos pacientes adultos com apendicite. Além disso, a contagem de neutrófilos é superior a 75% em 78% dos pacientes. O hemograma mostra diferentes razões de probabilidades (odds ratio, O.R.) para diferentes níveis de leucócitos. O.R. de leucócitos de 9-11000 é 0,29. No entanto, leucócitos de 11-13000 tem 2,8 O.R. 

Proteína C reativa (PCR) é útil, e geralmente é maior que 1 mg / dL. Contudo, não consegue detectar o local da infecção. Assim, não é específica para apendicite. Estudos mostram que a sensibilidade do PCR está entre 93% e 96,6% para apendicite aguda. Um nível normal de PCR tem um valor preditivo negativo de 97-100% para apendicite nos pacientes com sintomas superiores a 24 horas. Investigadores também estudaram as combinações de contagem de leucócitos, PCR e contagem de neutrófilos para excluir com segurança o diagnóstico de apendicite aguda. Pacientes com uma contagem de leucócitos abaixo de 10000 / mm3 e um PCR abaixo de 6 a 12 mg / dL é improvável ter apendicite aguda (O.R. negativo: 0,09). Pacientes com Contagem de leucócitos acima de 10000 / mm3 e PCR acima de 8 mg / dL provavelmente têm apendicite aguda (O.R. proporção: 23,32).

A urinálise pode diferenciar diagnósticos como infecções do trato urinário. Contudo, o apêndice tem uma relação com o ureter direito e, em alguns casos, piúria pode não se referir apenas a infecções urinárias. Piúria pode ocorrer em casos de apendicite, mas marcas de piúria graves são mais prováveis em​​infecções do trato urinário. Além disso, proteinúria e hematúria em urinálise geralmente sugere distúrbios geniturinários ou hematológicos. Mulheres em idade fértil devem ter gravidez avaliada. Gravidez ectópica deve estar em sua mente sempre. 

A Tomografia Computadorizada (TC) tem 94% de sensibilidade e especificidade de 95% e mostra maior precisão diagnóstica sobre USG (Sensibilidade: 88%, especificidade: 94%) para apendicite aguda. Um grande centro único de estudo constatou que a TC tem uma alta taxa de sensibilidade e especificidade (98,5% e 98%, respectivamente) para apendicite aguda. Embora o uso de contraste intravenoso e oral possam aumentar a sensibilidade, podem prolongar a permanência, causar reações alérgicas e vômito. Portanto, em adultos, TC abdominal e pélvica pode ser realizada com ou sem contraste.

Um apêndice saudável geralmente pode não ser visualizado por Ultrassonografia (USG). No caso de apendicite aguda, a USG tipicamente demonstra uma estrutura tubular não compressível de 7-9 mm de diâmetro no QID. No entanto, a USG não é tão precisa quanto a TC. USG é a primeira escolha, especialmente em pacientes pediátricos, mulheres grávidas e pacientes magros. Além disso, se uma patologia ginecológica é mais provável que apendicite aguda em mulheres, a USG pode ser o teste inicial para detectar patologias ginecológicas, como gravidez ectópica, cistos ovarianos ou outras patologias do sistema reprodutor feminino. E se o operador é um ultrassonografista experiente, pode ser o primeiro método de imagem. Também é importante enfatizar que USG é uma modalidade dependente do operador. Imagens de ultrassom mostram o aumento do tamanho da apendicite (abaixo). Mais de 6 mm é considerado anormal

O vídeo de ultrassom mostra as visualizações transversal e longitudinal de apendicite na mesma sequência. O apêndice é localizado 3-4 cm de profundidade da superfície da pele. Este vídeo não inclui medição. No entanto, o diâmetro relatado foi de 8 mm, o diâmetro atinge mais de 1 cm (10 mm) em algumas fatias.

Radiografias simples não são específicas ou econômicas. Podem visualizar um apendicolito (é altamente sugestivo de apendicite mas apenas em menos de 10% dos pacientes) ou no nível de ar ou fluido no QID.

Se a USG for equívoca, a Ressonância Magnética (RM) deve ser considerada em pacientes grávidas. Suas desvantagens são tempo longo de escaneamento, alto custo e disponibilidade limitada. Alguns pesquisadores sugerem ressonância magnética em vez de USG em pacientes pediátricos. A sensibilidade da RM (100%) é maior do que a USG (76%) em pacientes pediátricos com apendicite aguda.

Opções de Tratamento de Emergência

Muito poucos pacientes necessitam de ressuscitação agressiva durante a avaliação (fase ABC). Todos os pacientes com suspeita de desidratação ou septicemia devem receber acesso IV e terapia agressiva de cristaloides. Além disso, antieméticos e analgésicos parenterais devem ser administrados. Antibióticos profiláticos devem ser administrados para cobrir organismos gram-negativos e anaeróbicos.

Uma das discussões globais importantes é o uso analgésico em apendicite. Ainda há discordância entre diferentes grupos de médicos, especialmente médicos de emergência e cirurgiões em algumas instalações. Uma revisão de Cochrane de 2011 relatou que “O uso de analgesia para dor abdominal não mascara descobertas nem atrasa o diagnóstico ”. No entanto, os únicos analgésicos recomendados nesses pacientes são opioides.

Considerações Para Pacientes Pediátricos, Geriátricos E Gestantes

Apendicite tem taxas relativamente altas de erros de diagnóstico em ambos os extremos de idade. Em crianças, a taxa de erros de diagnóstico é 2 5 – 3 0%. Os erros diagnósticos mais comuns são gastroenterite e infecções do trato respiratório. Os sintomas precoces como perda de apetite ou vômitos são inespecíficos. Eles podem facilmente levar o médico a outros diagnósticos como gastroenterite, infecção urinária ou respiratória.

Dez por cento das apendicectomias são realizada em idosos. As taxas de erros diagnósticos são altas nesta faixa etária também. Idosos inicialmente relacionam seus sintomas com suas comorbidades. Como resultado, a apresentação tardia ao médico de emergência pode causar atraso diagnóstico. Além disso, os efeitos colaterais das drogas em curso podem mascarar sua condição aguda. Portanto, uma apresentação tardia ou insignificância dos sintomas não deve dissuadir o clínico do diagnóstico. O atraso no diagnóstico está relacionado ao aumento de mortalidade e morbidade. As taxas de mortalidade variam de 0,1% a 1% em crianças, e sobe acima de 20% em pacientes com mais de 70 anos. Em geral, a taxa de perfuração varia de 16% a 40%. As crianças mais jovens têm uma taxa de perfuração mais alta entre 50 a 85%. Atrasos diagnósticos podem aumentar as taxas de perfuração em até 55-70% em pacientes com mais de 50 anos.

A incidência de apendicite na gestante permanece inalterada em comparação com a população em geral, mas alterações na apresentação podem atrasar o diagnóstico. Durante a gravidez, apêndice se reposiciona para a direita do rim direito e sobe acima da crista ilíaca em cerca de 4,5 meses de gestação. Dor no QID e sensibilidade pode ocorrer no primeiro trimestre, mas a dor no QSD ou no flanco pode dominar depois. Os sintomas são semelhantes aos da gravidez no primeiro trimestre como náuseas, vômitos e anorexia. Os médicos devem considerar apendicite se estes sintomas reaparecerem mais tarde na gravidez. No entanto, a contagem de leucócitos não é confiável na gravidez por causa da leucocitose fisiológica. Modalidades de imagem de USG ou RM podem ser usadas para o diagnóstico.

Tomada de decisão

Os achados clínicos orientam a estratificação de risco. Escores de estratificação de risco guiam as modalidades de diagnóstico e decisões como alta hospitalar, observação ou consulta em cirurgia. A Escala de Alvarado é uma classificação bem conhecida para apendicite. (Tabela 7.1)

CATEGORIA EXPLICAÇÃO ESCORE
Sintomas Migração 1
Anorexia ou cetose na urina 1
Náusea ou vômito 1
Sinais Sensibilidade no quadrante inferior direito 2
Dor à percussão
Aumento da temperatura (oral >37.3 °C) 1
Laboratorial Leucocitose (>10.000/mm3) 1
Desvio à esquerda (75% de neutrófilos) 2
Escore total 10

Escore

1-4 apendicite improvável

5-6 apendicite possível

7-8 apendicite provável

9-10 apendicite muito provável

Decisões de disposição

Pacientes com achados físicos mínimos e uma forte alternativa diagnóstica ou múltiplose pisódios prévios de dor semelhante são considerados de baixo risco. Em pacientes de baixo risco, a melhor conduta é aconselhar sobre sinais de apendicite e providenciar um acompanhamento rigoroso em 12 a 24 horas. Pacientes com alta devem iniciar uma dieta líquida e avançar para os sólidos quando os sintomas melhorarem. Pacientes com dor abdominal não específica, que requerem doses significativas de opiáceos devem ser considerados para a admissão. Pacientes com sintomas duvidosos, principalmente mulheres em idade fértil, homens e crianças com sinais atípicos, devem ser considerados para teste diagnóstico ou observação ativa. Homens e crianças com apresentações clássicas estão sob alto risco e ganham pouco benefício com imagens. O médico da emergência deve consultar o paciente com auxílio do cirurgião geral sem demora. A apendicite aguda é a causa mais comum para a cirurgia abdominal emergencial e a apendicectomia continua sendo o único tratamento curativo. Antibioticoterapia sem apendicectomia pode ser suficiente para apendicite não complicada, especialmente na população pediátrica.

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