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Por: Vijay Nagpal and Bret A. Nicks
Tradução: Rafael Maia de Almeida
Revisão: Rebeca Bárbara da SIlva Rios

Introdução

A Medicina de Emergência e as situações dentro do departamento de emergência podem ser um ambiente estressante e de rápida mudança, também pode te fazer sentir como se houvesse pouco tempo para uma comunicação eficaz com o paciente, para dar cuidados centrados no paciente ou para oportunidade de estabelecer uma relação apropriada com ele. É também um ambiente diferente de qualquer outro na medicina, onde uma equipe única de indivíduos enfrenta vários graus de caos com disponibilidade limitada de informações para trabalhar em conjunto e abordar as condições médicas daqueles que chegam ao departamento. Poucos recomendariam entrar em tal ambiente na ausência de um protocolo de atendimento estabelecido e meios de comunicação claros. O tom do departamento está definido antes mesmo de entrar no DE; a partir do momento em que você entrar no departamento, noções preconcebidas e preconceitos permanecem na porta.
Não é surpresa que os departamentos de emergência de alto desempenho tenham equipes de alta performance e de boa comunicação. Definir e comunicar claramente a todos os membros da equipe o porquê de estarmos lá e como cuidamos dos pacientes, define o modo para cada interação interpessoal. Isso é verdade não apenas para a relação entre paciente e médicos, mas também para as interações com a equipe de enfermagem, auxiliares e reguladores (Gluyas, 2015). Estabelecer uma mentalidade de equipe e reconhecer o valor das contribuições que nossos colegas e funcionários trazem para o DE é essencial para uma prática de atendimento médico de emergência seguro e de alta qualidade. Além disso, o conjunto de habilidades que as pessoas de outras áreas da saúde trazem para a equipe pode nos ajudar a olhar de uma perspectiva diferente para entender melhor nossos pacientes e proporcionar o melhor atendimento que pode ser oferecido no DE (Klauer e Engel, 2013).

Fundamentos da Comunicação

A abordagem para fornecer atendimento de qualidade ao paciente no departamento de emergência começa com o reconhecimento da perspectiva incompatível do médico-paciente sobre o que aconteceu e o que está ocorrendo (Helman, 2015). É essencial reconhecer que a relação médico-paciente começa com um significativo desequilíbrio de poder. Devem ser feitas tentativas para normalizar ou reduzir esse desequilíbrio, para capacitar os pacientes e suas famílias. Isso permitirá uma discussão aberta sobre suas preocupações médicas e auxiliará na tomada de decisões baseada em informações sobre seus cuidados. É importante reconhecer a espera ou o processo que eles já enfrentaram antes de chegar até você. Agradeça ao paciente (e à família) por ter vindo ao DE e permitir que você resolva suas preocupações médicas. Além disso, reserve um tempo para se apresentar a todos na sala com o paciente e descubra quem são em relação ao paciente. Isso pode ajudar a estabelecer rapport com o paciente e aqueles que o rodeiam (Chan 2012, Cinar 2012, Hobgood 2002).

Enquanto muitos acreditam que o ambiente de atendimento é o maior fator limitante em detrimento à comunicação de qualidade, a literatura sugeriria o contrário. Estabelecer um relacionamento positivo entre os envolvidos é essencial para o atendimento ao paciente. É preciso reconhecer que, embora você não consiga resolver a condição do paciente ou a doença crônica, o uso de habilidades de comunicação eficazes e o fornecimento de uma experiência positiva ao paciente irão amenizar muitos medos (Mole, 2016). Tenha em mente que, em geral, os pacientes lembram menos de 10% do conteúdo (o que foi realmente dito), 38% de como você diz (linguagem verbal) e 55% de como você está dizendo (linguagem corporal) (Helman). , 2015).

Atendentes que se comunicam com eficiência empregam rotineiramente esses 5 passos:

1.Seja genuíno
Nós sabemos. As pessoas podem sentir a pessoa sem sinceridade – seja um pressentimento ou por outros sentidos. Tente ver a situação do ponto de vista do paciente, e isso vai garantir que você esteja agindo na melhor das intenções e com integridade.

2. Seja presente
Como atendentes de emergência, somos interrompidos mais do que qualquer outra especialidade. No entanto, durante os poucos momentos em que estamos envolvidos com o paciente ou sua família, esteja completamente presente. Se houver uma interrupção planejada, informe antes de iniciar um diálogo. Concentre-se neles e na conversa; valorize o que eles têm para compartilhar. No final do seu encontro, resumir brevemente o que o paciente lhe disse pode ajudar a tranquilizá-lo sabendo que você estava ouvindo e também dará a ele a chance de esclarecer as discrepâncias.

3. Pergunte
Para se comunicar efetivamente, é preciso ouvir mais do que ele fala. Depois de se apresentar, pergunte sobre a preocupação médica do paciente; Dê-lhes 60 segundos de tempo ininterrupto. A maioria dos pacientes se surpreende e fornece informações exclusivas que, de outra forma, não seriam obtidas. Uma vez que o paciente tenha lhe dito suas preocupações, comece a fazer as perguntas específicas necessárias para diferenciar ainda mais os cuidados necessários. Fazendo perguntas e permitindo respostas, você faz sobre eles e dá a eles uma maneira de compartilhar com você o que eles estão mais preocupados, permitindo que você resolva essas preocupações.

4. Ganhar confiança
Dada a natureza do relacionamento medico-paciente em medicina de emergência, desenvolver a confiança é essencial, mas muitas vezes difícil. Construir confiança é como criar o fogo; Começa com o contato inicial e cresce a cada interação. A confiança também se baseia no engajamento em interações físicas culturalmente aceitáveis (Chan, 2012), como um aperto de mão, uma mão no ombro ou uma postura envolvente.

5. Comunique-se diretamente
Assegure-se de que no final do encontro inicial você tenha estabelecido um plano claro de atendimento, o que o paciente pode esperar, quanto tempo levará e quando voltará a reavaliar ou fornecer informações adicionais. Fazer isso permite que o paciente esteja mais envolvido em seus cuidados e faça mais perguntas sobre seu progresso e plano de tratamento. Além disso, ajudar o paciente a entender o que esperar enquanto estiver no departamento pode auxiliar no alívio do medo associado a exames laboratoriais ou de imagem que não foram previamente avisados, especialmente quando esses exames podem exigir que ele seja temporariamente retirado do departamento (por exemplo, uma transferência para realizar uma tomografia computadorizada).

Muitos desses conceitos foram identificados na satisfação do paciente e nas métricas operacionais. Em um estudo, os tempos de espera não foram associados à percepção da qualidade do atendimento, mas a empatia do provedor durante a interação inicial foi claramente associada (Helman, 2015). Além disso, a insatisfação do paciente com atrasos no atendimento está menos relacionada ao tempo real gasto no PS e mais com a definição de expectativas de tempo sobre o processo de atendimento, uma percepção de falta de atenção pessoal e uma percepção de falta de comunicação da equipe e preocupação com o conforto do paciente.

6.Empatia
No pronto-socorro, é essencial entender que muito do cuidado de um paciente está relacionado à empatia – a capacidade de compreender e compartilhar as experiências e emoções de outra pessoa. Recomenda-se tentar entender as pautas do paciente. Pode-se fazer isso perguntando: “Ajude-me a entender o que o trouxe hoje”. “Ajude-me a entender o que posso fazer por você.” “Me diga mais.” Isso ajudará a ordenar a situação do paciente e obter uma visão única sobre suas preocupações com o tratamento.

Existem quatro etapas fáceis para melhorar a escuta reflexiva e a empatia percebida no ED:

1. Eco – Repita o que o paciente disser; isso transmitirá a mensagem de que você ouviu o paciente.
2. Paráfrase – Reformule o que o paciente diz, pois isso dá mostra que você entende o paciente.
3. Identifique o sentimento – Diga, por exemplo, “você parece frustrado”, “preocupado”, “chateado”. Isso produz confiança.
4. Validação – Valide os sentimentos do paciente verbalmente dizendo declarações como “Eu posso ver por que você se sente assim”.

Há também um ótimo módulo on-line e mnemônico para o desenvolvimento de habilidades de compreensão empática (SMACC, 2016). O mnemônico RELATE é:
• Reassure – compartilhe suas qualificações e experiência;
• Explain – descreva em linguagem clara e concisa o que o paciente pode esperar;
• Lisen – não apenas ouvir, encoraje o paciente a fazer perguntas;
• Answer – resumir o que eles disseram e confirmar sua compreensão;
• Take action – discuta e defina as etapas de cuidado (e o que esperar);
• Expresse agradecimento – agradeça ao paciente por permitir que você cuide deles.

A abordagem

Como em muitas situações da vida, a comunicação eficaz é a cola que ajuda a estabelecer conexões com os outros e a melhorar o trabalho em equipe, a tomada de decisões e a solução de problemas. Facilita a comunicação de mensagens negativas ou difíceis sem criar conflito ou desconfiança. Reconhecer isso ajuda a fornecer a melhor base e abordagem para a comunicação bem-sucedida com o paciente, um elemento essencial no DE. Além de compreender as cinco etapas da comunicação efetiva, a abordagem para uma comunicação eficaz também deve ser guiada pelo paciente individualmente e ajustada de acordo. Portanto, considere ver sua abordagem da perspectiva do paciente e defina o tom com os três pontos iniciais a seguir.

Os 3 pontos de partida:
1. Abordagem e Aparência:
• Vista-se apropriadamente;
• Sente-se ao lado do paciente;
• Mantenha uma postura aberta (evite cruzar os braços);
• Mantenha um bom contato visual, se culturalmente apropriado;
• Sorria apropriadamente, acene afirmando.
2. Como dialogar
• Fale devagar e em ambiente silencioso (dadas as restrições do DE);
• Use um tom baixo em sua voz;
• A empatia pode ser ouvida em seu tom.
3. O que dizer
• Apresente-se de uma maneira culturalmente apropriada;
• Use o sobrenome do paciente, ajuda a minimizar o desequilíbrio de poder; (Aqui no Brasil essa prática não é muito comum, porém vale incrementar com os vocativos adequados para a idade por exemplo, Sr, Sra)
• Reconheça todos na sala e pergunte qual é a relação deles com o paciente (aperte as mãos se for culturalmente apropriado);
• Ajuste a linguagem médica com base na capacidade de entendimento do paciente.
Além de compreender os cinco aspectos essenciais da comunicação e definir o tom para a abordagem inicial, é importante entender alguns dos motivos comuns pelos quais a comunicação falha ou é bem-sucedida no Departamento de Emergência. Embora uma estrutura de abordagem única nem sempre caiba, há alguns “faça” e “não faça” essenciais que também devem ser considerados.
Faça
• Deixe o paciente contar sua história (Roscoe, 2016);
• Estabelecça qual é a pauta do paciente, quais são seus medos;
• Forneça ao paciente informações sobre o que acontecerá durante a sua estadia. Isso coloca o paciente mais à vontade e melhora a satisfação (Hobgood, 2002);
• Proporcione tempos de espera adequados. Alguns especialistas sugerem superestimar o tempo para resultados e serviços de consultoria (Técnica Disney);
• Explique as razões dos atrasos e peça desculpas por isso;
• Após a sua anamnese e exames físicos, mapeie os próximos passos do processo (ou seja, estabeleça expectativas).
Não faça
• Cruze os braços sobre o peito, pois isso mostra uma postura agressiva;
• Pergunte por que o paciente não veio mais cedo;
• Diga: “Eu acho”;
• Pergunte repetidamente: “por quê?”;
• Use as palavras “nunca” ou “sempre”.

O paciente difícil
Ao se deparar com pacientes difíceis no pronto-socorro, a compreensão da situação e a motivação do paciente podem ajudar a melhor lidar com os desafios de comunicação presentes. Um encontro difícil com o paciente no departamento de emergência pode muitas vezes ser frustrante para o médico e para o paciente. Esses pacientes geralmente apresentam problemas médicos crônicos que são sobrepostos ao indivíduo com disparidades sociais (Hull & Broquet 2007, Dudzinski & Timberlake 2016). Estes são apenas alguns exemplos de tipos de pacientes que podem ser encontrados no departamento de emergência:
Tipo de paciente e sugestão
Paciente irritado
Não ignore o fato de que um paciente pode estar zangado ou chateado – geralmente está relacionado a atrasos, expectativas ou preocupações com o atendimento. Tente explorar essa emoção fazendo perguntas neutras e sem confronto. O reconhecimento e um simples pedido de desculpas por questões de processo podem ser inestimáveis.
Paciente Manipulativo
Embora esses pacientes possam claramente ter uma lista secundária, suas queixas médicas ainda podem ser legítimas. Aborde esses pacientes com a mente aberta, mas esteja preparado para dizer não aos pedidos que não são clinicamente indicados.
Pacientes frequentes
A alta reincidência pode ser frustrante, mas é importante entender que pode haver uma razão subjacente para freqüentes visitas de emergência. Condição socioeconômica e falta de acesso ao atendimento são motivos comuns. Conhecer os recursos disponíveis (por exemplo, assistentes sociais, enfermagem de suporte clínico) pode fazer a diferença.
Paciente Combativo / Agitado ou Intoxicado
É muito importante manter o paciente e a equipe (incluindo você) em segurança. Redirecionar o paciente e enfatizar a importância de cuidar dele medicamente pode ajudar a acalmar a situação. A intervenção psicofarmacológica pode ser necessária em alguns momentos. Para um aprofundamento na comunicação eficaz com o paciente relacionada ao gerenciamento de pacientes difíceis, escute o Episódio 51: Comunicação Efetiva do Paciente – Gerenciando Pacientes Difíceis por Anton Helman.

A entrega
A comunicação entre profissionais de saúde durante a transferências de cuidados do paciente apresenta um dos desafios mais conhecidos no atendimento ao paciente e erros no gerenciamento do atendimento. Essa transfêrencia de cuidados, muitas vezes percebida como a “zona cinzenta”, tem sido caracterizada pela ambiguidade em relação à condição médica, tratamento e disposição do paciente (Akper, 2007). Erros de comunicação, particularmente relacionados a transferências de pacientes, são responsáveis por quase 35% dos 50 erros de atendimento relacionados ao DE. Estabelecer um processo padronizado para garantir a qualidade e a clareza das transições no atendimento é essencial. Um exemplo é o formato EU-POSSO que é especificamente focado na população de pacientes do DE.

Ferramenta de transferência de pacientes com base em DE (I-CAN)
I. Introdução
Descreva brevemente o que levou o paciente ao departamento de emergência hoje. Por exemplo, o paciente é um homem de 53 anos com história pregressa de DPOC que se apresenta hoje com tosse produtiva, chiado e falta de ar.

C – Conteúdo Crítico e Intervenções Realizadas
Relacione as informações que ajudam o profissional que estiver recebendo a entender o curso do DE até este ponto.
Por exemplo: Na avaliação inicial, o paciente não conseguia falar frases completas e a saturação de O2 era de 88% em ar ambiente. Nós iniciamos ventilação não invasiva com pressão positiva (VNI) e os tratamentos com nebulizador foram ofertados. Esteróides de uso inalatório foram administrados ao paciente aqui no departamento.
A – Questões Ativas
Dê ao profissional uma ideia da condição atual do paciente no momento. Por exemplo, o paciente melhorou com uma hora de VNI e foi transferido para cânula nasal de alto fluxo com saturação de O2 a 93%. No momento, estamos tentando diminuir o suplemento de O2 conforme tolerado.
N – (NEXT) Próximos Passos e Disposição Antecipada
Descreva ao profissional que está recebendo as informalçoes o que precisará ser seguido e a disposição antecipada do paciente. Por exemplo, o paciente precisará ser admitido por uma exacerbação da DPOC com um novo suprimento de O2. Ele pode ir para a enfermaria se permanecer estável na cânula nasal.
Embora existam muitos exemplos para uma transferência padronizada, identificando uma abordagem definida e estabelecendo a expectativa de uso de rotina, especialmente quando integrada ao prontuário eletrônico de saúde nas transferências de cuidados, assegure a melhoria com o atendimento ao paciente, qualidade e produtividade (Akper 2007, Rouke 2016). Se o paciente e a família estiverem envolvidos com essa transferência, não apenas entenderão as expectativas de atendimento, mas também entenderão melhor os problemas com atrasos, próximas etapas e atualizações de atendimento.

Conclusão
A maioria concorda que a prestação de assistência ao paciente no DE apresenta muitos desafios. As situações com as quais trabalhamos podem apresentar um ambiente estressante e acelerado, em que podemos nos sentir como se tivéssemos pouquíssimo tempo para uma comunicação efetiva, oportunidade de estabelecer uma ótima experiência e atendimento centrado no paciente. No entanto, também é evidente que a melhoria da comunicação entre a equipe de atendimento e os pacientes beneficia não apenas a experiência de cuidado, mas também os resultados da assistência ao paciente. A comunicação de qualidade aperfeiçoa os resultados, a conformidade e a satisfação do paciente, sem mencionar o trabalho e a satisfação da equipe. Embora existam muitas técnicas para desenvolver uma comunicação eficaz no DE, é essencial estabelecer uma cultura para adaptar habitualmente essas práticas. O DE é um ambiente diferente de qualquer outro na medicina, onde uma equipe única de indivíduos trabalha em vários graus de caos em conjunto com informações limitadas disponíveis para abordar as condições médicas daqueles que se apresentam ao departamento. Fazê-lo com uma comunicação eficaz pode fazer a diferença.

Referências e Leitura Adicional, clique aqui.